Nostalgica – Um “museu” com bits – Rubber Chicken

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Já ouviram falar de Pokemon Go? Já repararam que cada vez que um tipo está prestes a fazer o test drive aos dois lombos de massa morta abaixo do tronco a porcaria do servidor vai abaixo? Sábado dia 16 foi um destes dias. Enquanto o povo de gostos caducados procurava terra infértil para uma necrose estética ao epiderme, eu, armado em explorador das FADs urbanas, consegui encontrar um alvo capaz de justificar um safari pela tundra alfacinha: A Inauguração do primeiro museu de videojogos em Portugal. 
Situado algures onde se abandonam idosos e banqueiros churrasqueiros, o trajeto prometia saciar-me o pokedex com uma fauna virtual rendida às minhas pokéballs. Ainda à procura de um assento, o polegar a apalpar o vidro quente, a bateria a derreter que nem um Calipo esquecido no banco de trás, ouço as portas do autocarro para Algés a fecharem-se enquanto o ecrã do dispositivo anuncia a sentença: “Estamos a contar a guita, tenta mais tarde otário!”. Sem possibilidade de voltar atrás, lá fui eu, constrangido com essa coisa dos objetivos concretos.
Os dois quilómetros que separam os autocarros do Palácio dos Aciprestes são mais do que suficientes para recordar que a nossa sofisticada existência sem veículo particular não tem razão de ser no Oeste selvagem. Passado o fardo da subida, chego finalmente ao destino. Mário Tavares, uma cara conhecida das exposições portuguesas e pai do projeto, trocou a habitual t-shirt por uma camisa azul megaman e calças bege… Ao estilo daqueles viticultores entrepreneur que aparecem nos canais de notícias. A seu lado, uma senhora da instituição, corresponde-lhe em solenidade e ambos discursam para uma plateia diversificada de nerds, crianças quase nerds e esposas reféns do matrimónio. É o lado formal da iniciativa, aquilo que parece o encontro improvável entre os constrangimentos dos fundos culturais e um apaixonado do antigamente.

Mário a promover sinergias… Talvez?
Mário Tavares, não sendo o único colecionador em Portugal, tem o mérito de ser dos mais generosos. Nos dias em que as Expos de Gaming oferecem filas intermináveis para experimentar demos da Fnac ou testar a caligrafia de um tipo das “Internets”, o espaço do Nostalgica é um refúgio que não falha. Uma ocasião sempre renovada para pais e filhos se reencontrarem à volta da qualidade pré-histórica destes consolas feitas de bits e cartuchos húmidos de cuspo.
O projeto integra-se precisamente na mesma linha proporcionando uma casa fixa para estes artefactos.
Discurso feito, tempo de nos aproximar do espaço do “museu”. A fita ainda por cortar, não faltam os impacientes a apalpar sticks nas máquinas de arcade e simuladores espalhados pelo jardim. Ao fundo, as máquinas da Sony e a sua praga FIFA contrastam com os contornos rústicos das bestas de madeira que só pecam por lhes faltar os adornos de chiclete e cinza.
Corta-se a fita. Aplaude-se. Dispara-se a cortiça. Entram os visitantes mais impacientes…

Um copo de espumante. Dois copos de espumante… Constato que a Sumol faz sabores tropicais e indigno-me com a modernice: tempo de limpar os sentidos desta contemporaneidade absurda.
Nesta tarde de verão o Nostalgica é uma estufa escura recheada de três décadas de malefícios tecnológicos. Ao calor da estação junta-se o imponente exército de vampiros eléctricos a acalentarem o ar com a sua dispendiosa existência. Distribuídas num engenhoso conjunto de mobília Ikea, as consolas das décadas passadas oferecem-se aos curiosos com um provocador “press start” mas nuas de explicação. O Mário assegura-me que está nos planos mas, por enquanto, os visitantes terão que contentar-se com as preciosas caixas originais para servir de bússola cultural.
O Nostalgica é nesse sentido mais próximo de uma man cave de sonho do que de um museu convencional ao estilo da exposição temporária Game On. Perante tamanha concentração de relíquias, os sentidos abandonam a solenidade ordeira pela inveja de quem visita a casa daquele amigo rico a quem os pais compram tudo. As prateleiras recheadas de jogos estão disponíveis ao toque e podem ser inseridas nas consolas respetivas à vontade. A música pop dos anos 80 raspa as paredes cobertas de capas de vinis enquanto uma torre de ecrãs catódicos relembram o templo dos jogos e séries de grão VHS. Se os gaming PC e consola não for do nosso agrade, uma segunda sala mais pequena concentra várias máquinas arcade para todos os gostos.

O frenesim da inauguração e o seu cortejo de conversas e fotos não facilitam a concentração e vou platonicamente de máquina em máquina manusear plástico antigo. Não tenham dúvidas, se nos autorizarmos o sossego, o Nostalgica tem todo o potencial para fazer justiça ao seu nome. Numa altura em que o fenómeno retro é parte assumida do presente, o fascínio por estes objetos de outrora conseguirá chegar ao coração de muitos visitantes. Quanto ao cérebro tenho mais dúvidas…
Não faltam planos para este Nostalgica. As exposições itinerantes continuarão a existir. O Mário compromete-se a trabalhar a componente pedagógica com um dia semanal dedicado às visitas de escolas e workshops diversos. Avizinham-se parcerias para exposições inéditas tanto no espaço do Nostalgica como em museus de maior dimensão, algo que a longo prazo poderá cumular numa mudança completa de espaço para um edifício mais ambicioso.

Falta-me recordar que o museu está aberto aos curiosos dos pixels todos Sábados pelo módico preço de peanurz. Quem tiver uma antiguidade relevante em casa pode emprestar a sua preciosidade ao museu, sem compromissos, contactando o Nostalgica através do e-mail: nostalgica@sapo.pt
Se o jogo for mesmo bom ponham-me em CC que também quero experimentar.
…Será que o servidor do Pokemon Go já voltou?

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